Os apartamentos do gerente e os craques
POR ROBERTO SALIM*
O Santos tinha Pelé. O Corinthians tinha sempre grandes contratações. E o Palmeiras do Jorge Vieira tinha Rosemiro, Jorge Mendonça, Toninho. Ou seja, os repórteres tinham do que falar com a bola rolando"
Quando os craques somem, a torcida padece.
E as notícias da bola saem das quatro linhas.
Por isso, um dos assuntos futebolísticos mais comentados em São Paulo nesta semana foi a questão do aluguel de dois apartamentos do gerente de futebol do Palmeiras. Ele alugou para integrantes da comissão técnica do clube.
Tudo bem?
Sim: os apartamentos são dele.
E o dinheiro é dos funcionários.
Mas… os funcionários em questão recebem aumento concedido por ele próprio…
Opa!!!
É ético ou não é?
Bom, esse é um assunto interno do clube alviverde.
E essas são questões que raramente vêm a público.
Recuando no tempo, a gente vai ver que, com tantos craques nos times grandes, dificilmente um tema desses seria campeão semanal de leitura. Mas dada a atual escassez de bons jogadores…
Por exemplo, no Santos de Pelé, Lima, Dorval, quem iria se preocupar com o aluguel que o maravilhoso clube da Vila pagava para seus jogadores na Pensão da dona Georgina?
E a turma que ia filar boia na casa do técnico Vicente Feola? A mulher do treinador da Seleção e do São Paulo era uma cozinheira inacreditável. E o bonachão do Feola levava de jogadores a dirigentes e jornalistas para os banquetes. Não importava o time a que pertencessem ou torcessem.
E nunca virou assunto da semana as encomendas de jornalistas gorduchos, que adoravam as delícias feitas em alguns casos em forno à lenha. Na década de 50, tinha um "bolão" em especial (eu não vou declinar o nome) que, sem que Feola soubesse, passava tarde da noite na casa e pegava uma carne assada deixada escondida na caixa do correio.
(Mas quem iria escrever sobre isso quando o São Paulo tinha Canhoteiro, Zizinho, José Poy, Dino Sani e Gino Orlando?)
Ou ainda que no Corinthians qualquer jogador recém-contratado ganhava direito de morar no edifício da Rua São Jorge, ali bem pertinho da Fazendinha? O prédio era do presidente alvinegro Vicente Matheus, e eu particularmente acho que toda a tropa morava de graça lá.
Chegou Paulo Borges? Vai morar lá.
Chegou Buião? Vai morar lá.
Chegou o técnico Duque? Vai morar lá.
Mas também não tenho certeza se era de graça mesmo.
O que sei é que o técnico Jorge Vieira, em sua passagem pelo Palmeiras na década de 70, residia na Rua Caiowas, nas Perdizes, quase esquina da Rua Vanderlei, em um prédio de seis andares que pertencia a um diretor do clube. E sei que a moradia fazia parte do contrato, ou seja, ele não pagava nada de aluguel.
E Telê Santana, que morava no Centro de Treinamento do São Paulo e amanhecia catando praguinhas no gramado, para que seus jogadores se aperfeiçoassem cada vez mais no bater na bola?
O Santos tinha Pelé.
O Corinthians tinha sempre grandes contratações.
E o Palmeiras do Jorge Vieira tinha Rosemiro, Jorge Mendonça, Toninho.
Ou seja, os repórteres tinham do que falar com a bola rolando.
Vez ou outra vinham denúncias.
Desconfianças.
E até fatos concretos como a vez em que o Palmeiras queria contratar o Falcão, mas o dinheiro da venda de Luís Pereira e Leivinha para a Espanha escorreu pelos investimentos equivocados do presidente da época.
Aquilo foi verdadeiramente um escândalo.
E não foi das notícias mais lidas naquela semana.
Esse sim foi um assunto top durante anos.
*Publicado originalmente no Ultrajano.
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Colunas na Folha: https://www1.folha.uol.com.br/colunas/jucakfouri/