70 anos de uma grande tragédia
Por Marcelo Torres*
Foi num 4 de maio, no ano de 1935, que nasceu Sanfilippo, o craque argentino José Francisco Sanfilippo, que até andou jogando aqui no Brasil, no Bangu e no Bahia.
Também foi num 4 de maio, em 1943, que nasceu Asparuhov, o maior jogador da Bulgária, ele que disputou três Copas do Mundo (1962/1966/1970) e faleceu em 1971.
Mas, no baú do esporte, o dia 4 de maio marca uma das maiores tragédias do futebol mundial.
Em 4 de maio de 1949, portanto há 70 anos, praticamente todo o elenco do Torino, da Itália, que talvez fosse melhor time do mundo à época, morreu em acidente aéreo.
Naquela década de 1940, o Torino era o grande time de Turim, da Itália e da Europa. Se já houvesse a Liga dos Campeões, seria o grande favorito.
Até aquele ano, só haviam sido disputadas três copas do mundo (1930, 1934 e 1938), e a Itália era a grande bicampeã, tendo vencido as duas últimas.
O Torino dos anos quarenta ganhou seis títulos nacionais, cinco vezes de forma consecutiva, batendo recorde atrás de recorde: número de pontos, número de vitórias, maiores goleadas.
A hegemonia do "Toro" era tamanha nos finais dos anos 1940 que, em alguns jogos da seleção italiana, todos os 10 jogadores de linha eram do Torino, apenas o goleiro não era do time de Turim.
A narrativa da tragédia começa dois meses e sete dias antes, no dia 27 de fevereiro, quando a seleção italiana jogou amistoso em Lisboa contra o selecionado português e venceu: 4 x 1.
Após a partida, o capitão da seleção lusa, Francisco Ferreira, que estava encerrando a carreira, pediu aos dirigentes italianos um amistoso do Torino com o Benfica, o clube que defendia.
O presidente do clube de Turim, de início, não queria o amistoso, porque o clube estava liderando o campeonato italiano e faltavam quatro rodadas para o final. Mas acabou cedendo e confirmando o jogo para o dia 3 de maio.
A peleja entre Benfica e Torino foi realizada na noite do dia 3 de maio e terminou com vitória dos anfitriões: 4 x 3, para um público de 40 mil pessoas.
No dia seguinte, de manhã, o avião, que tinha capacidade para 34 passageiros, decolou em Lisboa e fez escala para reabastecer em Barcelona.
Porém, da Espanha para a Itália, quando se aproximava para pousar em Turim, sob um forte nevoeiro, chocou-se com uma parte da Basílica de Superga.
Não houve sobreviventes.
Dos 31 passageiros, 18 eram atletas e cinco da comissão técnica do clube, os demais eram tripulantes e jornalistas que cobriam os jogos da equipe.
Cerca de 500 mil pessoas acompanharam os funerais.
O clube escalou sua equipe juvenil nas quatro últimas rodadas do campeonato italiano.
Seus rivais, na época, em solidariedade e justiça, também escalaram equipes juvenis.
O Torino venceu todos os jogos e sagrou-se pentacampeão.
Depois da tragédia, o clube até foi campeão na temporada 1975/1976, mas nunca mais recuperou a hegemonia do futebol no país e na própria cidade.
Seu arquirrival, a Juventus, conquistou Turim, a Itália, a Europa e o mundo.
Aliás, ontem (03/05), véspera da "data infeliz", os rivais se enfrentaram.
O Torino esteve na frente do campeão, mas cedeu o empate no final do jogo.
Em agosto do ano passado, irmanados por tragédias semelhantes, Chapecoense e Torino fizeram um jogo amistoso em Turim, com 2 a 0 para os anfitriões.
Neste sábado, nos gramados de todo o mundo, supõe-se que será respeitado um minuto de silêncio por essa triste página do futebol.
*Marcelo Torres, jornalista, baiano, mora em Brasília, é torcedor do Vitória.
Sobre o Autor
Colunas na Folha: https://www1.folha.uol.com.br/colunas/jucakfouri/