A montagem de um timaço
POR CHICO ALENCAR*
A lembrança de uma seleção de futebol veio de imediato, ao ler as 82 páginas da colaboração do diretor da Odebrecht, Cláudio Filho, para a Lava Jato. Na PPP – Promiscuidade Público-Privada – ali descrita, a ética não é convocada, como no mundo da velha cartolagem. E o futebol é de força, não de arte.
O esmerado planejamento do esquema corrupto é da Odebrecht, mas serve ao 'clube das empreiteiras'. Há um Departamento de Operações Estruturadas para a montagem do time. Seu diretor de futebol, ou melhor, de 'relações institucionais', detalhou o organograma.
OBJETIVO: viabilizar os negócios das empresas do grupo, "em situações específicas de interesse crítico".
MEIOS: "pedidos de apoio aos agentes políticos mediante frequentes concessões financeiras, com típica privatização desses agentes em favor de interesses empresariais (…) contribuições em períodos eleitorais e contrapartidas financeiras mais imediatas".
MÉTODO DE SELECIONAMENTO: "escolher agentes com relevância política e melhores condições de gerar resultados positivos para a empresa (…) preferencialmente os que exercem forte liderança em seus partidos e junto a seus pares". Era também preciso renovar contratos de "craques consagrados": "a empresa tem interesse na permanência desses parlamentares no Congresso, por historicamente apoiar nossos projetos e influenciar os demais agentes políticos".
JOVENS PROMISSORES: "identificar e apoiar políticos promissores (…) com a observação dos mesmos em seus estados de origem". Não se descuida das divisões de base…
PASSES À VENDA: "vários agentes políticos tentaram se aproximar de mim (…) às vezes somos abordados por pessoas com quem não temos relação, que se acham no direito de proceder assim em razão de possuir mandato eletivo".
OFERTAS E PREMIAÇÕES: "as retribuições financeiras foram realizadas nas contas dos partidos e campanhas, ou sem declaração à Justiça Eleitoral (…) presenteamos também com relógios Patek-Philippe, Hublot, Corum".
AS DISPUTAS: as pelejas do longo campeonato foram em torno de Medidas Provisórias, Projetos de Resolução, Projetos de Lei e até audiências públicas. Todas analisadas e acompanhadas pelo "Radar Legislativo", para incluir emendas de interesse das empresas do grupo.
UM GRANDE ELENCO: o elenco da degradação política, composto com titulares e reservas oriundos de quase todos os partidos, é suficiente para escalar vários times. Um verdadeiro escrete propineiro: Justiça, Caju, Babel, Bitelo e Corredor, Caranguejo e Gremista, Gripado, Campari, Piqui e Decrépito. Ou Ferrari, Angorá, Boca Mole, Botafogo e Moleza, Velhinho e Missa, Índio, Polo, Kimono e Tuca. Ou ainda Adventista, Bezerro, Castanha, Contador e Ferrovia, Corrida e Laquê, Lutador, Menino, Miúdo e Monte. E também Trave, Ovo, Rádio, Regime e Reitor, Comuna e Rezador, Seguros, Sogra, Tique Nervoso e Narigudo. E Zoológico, Italiano, Kafta, Mineirinho e Fazendeiro, Las Vegas e Misericórdia, Pino, Cerrado, Feia e Todo Feio, além de Bobão, Grisalhão, Encostado, Flamenguista e Timão, Baixinho e Padeiro, Cabeça Chata, Tanquinho, Duvidoso e Casa de Doido…
Para os mais afoitos, a concentração será em unidades prisionais. A temporada de 2017 promete!
*Chico Alencar é professor de História e deputado federal (PSOL/RJ).
Sobre o Autor
Colunas na Folha: https://www1.folha.uol.com.br/colunas/jucakfouri/