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Blog do Juca Kfouri

A montagem de um timaço

Juca Kfouri

30/12/2016 13h30

POR CHICO ALENCAR*
A lembrança de uma seleção de futebol veio de imediato, ao ler as 82 páginas da colaboração do diretor da Odebrecht, Cláudio Filho, para a Lava Jato. Na PPP – Promiscuidade Público-Privada – ali descrita, a ética não é convocada, como no mundo da velha cartolagem. E o futebol é de força, não de arte.


O esmerado planejamento do esquema corrupto é da Odebrecht, mas serve ao 'clube das empreiteiras'. Há um Departamento de Operações Estruturadas para a montagem do time. Seu diretor de futebol, ou melhor, de 'relações institucionais', detalhou o organograma.

OBJETIVO: viabilizar os negócios das empresas do grupo, "em situações específicas de interesse crítico".

MEIOS: "pedidos de apoio aos agentes políticos mediante frequentes concessões financeiras, com típica privatização desses agentes em favor de interesses empresariais (…) contribuições em períodos eleitorais e contrapartidas financeiras mais imediatas".

MÉTODO DE SELECIONAMENTO: "escolher agentes com relevância política e melhores condições de gerar resultados positivos para a empresa (…) preferencialmente os que exercem forte liderança em seus partidos e junto a seus pares". Era também preciso renovar contratos de "craques consagrados": "a empresa tem interesse na permanência desses parlamentares no Congresso, por historicamente apoiar nossos projetos e influenciar os demais agentes políticos".

JOVENS PROMISSORES: "identificar e apoiar políticos promissores (…) com a observação dos mesmos em seus estados de origem". Não se descuida das divisões de base…

PASSES À VENDA: "vários agentes políticos tentaram se aproximar de mim (…) às vezes somos abordados por pessoas com quem não temos relação, que se acham no direito de proceder assim em razão de possuir mandato eletivo".

OFERTAS E PREMIAÇÕES: "as retribuições financeiras foram realizadas nas contas dos partidos e campanhas, ou sem declaração à Justiça Eleitoral (…) presenteamos também com relógios Patek-Philippe, Hublot, Corum".

AS DISPUTAS: as pelejas do longo campeonato foram em torno de Medidas Provisórias, Projetos de Resolução, Projetos de Lei e até audiências públicas. Todas analisadas e acompanhadas pelo "Radar Legislativo", para incluir emendas de interesse das empresas do grupo.

UM GRANDE ELENCO: o elenco da degradação política, composto com titulares e reservas oriundos de quase todos os partidos, é suficiente para escalar vários times. Um verdadeiro escrete propineiro: Justiça, Caju, Babel, Bitelo e Corredor, Caranguejo e Gremista, Gripado, Campari, Piqui e Decrépito. Ou Ferrari, Angorá, Boca Mole, Botafogo e Moleza, Velhinho e Missa, Índio, Polo, Kimono e Tuca. Ou ainda Adventista, Bezerro, Castanha, Contador e Ferrovia, Corrida e Laquê, Lutador, Menino, Miúdo e Monte. E também Trave, Ovo, Rádio, Regime e Reitor, Comuna e Rezador, Seguros, Sogra, Tique Nervoso e Narigudo. E Zoológico, Italiano, Kafta, Mineirinho e Fazendeiro, Las Vegas e Misericórdia, Pino, Cerrado, Feia e Todo Feio, além de Bobão, Grisalhão, Encostado, Flamenguista e Timão, Baixinho e Padeiro, Cabeça Chata, Tanquinho, Duvidoso e Casa de Doido…

Para os mais afoitos, a concentração será em unidades prisionais. A temporada de 2017 promete!

*Chico Alencar é professor de História e deputado federal (PSOL/RJ).

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL

Sobre o Autor

Juca Kfouri é formado em Ciências Sociais pela USP. Diretor das revistas Placar (de 1979 a 1995) e da Playboy (1991 a 1994). Comentarista esportivo do SBT (de 1984 a 1987) e da Rede Globo (de 1988 a 1994). Participou do programa Cartão Verde, da Rede Cultura, entre 1995 e 2000 e apresentou o Bola na Rede, na RedeTV, entre 2000 e 2002. Voltou ao Cartão Verde em 2003, onde ficou até 2005. Apresentou o programa de entrevistas na rede CNT, Juca Kfouri ao vivo, entre 1996 e 1999 e foi colaborador da ESPN-Brasil entre 2005 e 2019. Colunista de futebol de “O Globo” entre 1989 e 1991 e apresentador, de 2000 até 2010, do programa CBN EC, na rede CBN de rádio. Foi colunista da Folha de S.Paulo entre 1995 e 1999, quando foi para o diário Lance!, onde ficou até voltar, em 2005, para a Folha, onde permanece com sua coluna três vezes por semana. Apresenta, também, o programa Entre Vistas, na TVT, desde janeiro de 2018.

Colunas na Folha: https://www1.folha.uol.com.br/colunas/jucakfouri/