O caso da continência na Olimpíada
Tanta coisa aconteceu na Rio 16 que alguns episódios acabaram sem comentário aqui.
Voltemos, portanto, ao caso dos atletas brasileiros que, patrocinados pelo Exército, bateram continência no pódio.
Pode mas não deveria?
Pode e está certo?
Se você lembrar que, em 1968, dois atletas americanos foram punidos por fazer o gesto do Poder Negro, braço esquerdo levantado, punho cerrado, perguntará: por que um gesto pode e outro não?
Se é verdade que a Olimpíada pretende disseminar a paz, convenhamos, um gesto militar lembra mais a guerra que a paz, embora se possa argumentar que o Exército exista para manter a paz.
Por outro lado, é preciso parar de diabolizar o papel das Forças Armadas.
Bater continência não é, necessariamente, um gesto nem de direita nem de esquerda.
Lembremos que o Exército começou a patrocinar os atletas no governo do PT e, principalmente, tem se mantido exemplar durante a crise política no país.
Teve como chefe, ministro da Defesa, durante mais de sete meses, entre o ano passado e este ano, um membro do PCdoB.
Somos nós que o sustentamos e existe para nos servir.
É certo que entre quem é de gerações que viveram o golpe de 1964 há compreensível aversão às Forças Armadas.
Mas aí também é preciso lembrar que os civis, empresários, religiosos, a mídia, foram aos quartéis pedir a deposição do presidente João Goulart, eleito legitimamente, com votos dele, que não fazia par com o renunciante Jânio Quadros.
O golpe de 1964 não foi apenas militar, foi civil e militar, com o apoio de quem "marchou com Deus pela família e pela propriedade".
Portanto, sem exageros.
Melhor que não houvesse a continência. Mas o gesto soa mais como agradecimento dos atletas a quem os apoia do que tem qualquer outro significado.
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Colunas na Folha: https://www1.folha.uol.com.br/colunas/jucakfouri/