Melhor deixar tudo como está
POR HUMBERTO MIRANDA*
Após a Copa do Mundo, só nos restou o retrocesso.
Se soubermos aproveitar a volta ao passado, podemos nos dar muito bem.
Viver do passado foi a forma encontrada pela CBF e pelos clubes para não mudar nada.
E eles podem estar certos.
A frase "quanto pior, melhor" pode ser aplicada literalmente aos clubes.
Ameaçar a destruição do futebol brasileiro é a melhor forma de conseguir se manter no poder através do dinheiro da viúva.
Temos de evitar quebradeiras desnecessárias.
Para que prender os caras que sonegam impostos?
Os clubes são maiores que qualquer interesse desse Estado insano de querer controlar tudo.
Se os clubes não conseguirem o que querem, já têm em quem pôr a culpa.
Não queremos isso.
É preciso incentivar o "espírito animal" dos clubes.
A CBF resolveu ressuscitar as glórias de 1994, quando tudo foi bem mesmo quando parecia estar muito mal.
Esse é o espírito. Naquela época de neoliberalismo na veia, plano real e Estado Mínimo fez com que os nossos negócios no futebol evoluíssem.
Nada de o Estado mexer no "Brasil que dá certo", como bem disse Carlos Alberto, o Parreira.
Levar de 7 a 1 numa semifinal de copa do mundo deixaria qualquer treinador estrangeiro um ano em silêncio e reflexão (vide a Argentina), mas essa não é nossa característica.
Gostamos dos treinadores carismáticos, amigueiros e dos profexores. Um técnico estrangeiro aqui tornaria tudo muito chato. Futevôlei, Empatite e Muricybol são nossos principais métodos de treinamento.
São criações nossas. Seleção é outra coisa. Nela, não se toca.
Quem sabe a gente não contribui para aumentar a satisfação do torcedor defendendo a extinção dos pontos corridos? Sim. É uma questão de adotar aquilo que deu certo, segundo as estatísticas.
Podemos sugerir de mudar a forma de disputa do Brasileirão e pedir à Rede Globo, sempre solícita, que diga quais são os clubes campeões de audiência. Vamos fazer várias finais num mesmo campeonato. Quanto a novela vai mal, o futebol vai bem e vice-versa. Assim a tabela converge com a novela e tudo ficaria bem, mesmo parecendo estar mal.
Diríamos ao pessoal do Bom Senso FC que os anos as manifestações dos anos de 1960 e o movimento das Diretas Já foram tolices juvenis que só nos trouxeram problemas insolúveis. Afinal, estamos todos no mesmo barco.
Mesmo que pareça que tudo vai mal, está tudo bem. Vamos dizer à rapaziada para congelar os altos salários dos jogadores famosos e abrir uma agência para recrutar os melhores jogadores daqueles clubes que ficam sem jogar campeonatos a maior parte do ano. Já pensou que negócio lucrativo?
Todos sairiam ganhando. Isso, sim, seria bom senso. Já fazemos coisas interessantes com as categorias de base. É melhor vender o garoto para formar lá fora. Ganhamos duplamente, pois os garotos virão pra Seleção já sabendo enfrentar os poderosos times europeus.
Pagamos ao Dunga para dar esporro na turma mais nova e pronto.
O restante, os nossos agentes liderados pro Gilmar Rinaldi saberão resolver.
É preciso ter visão de mercado.
Aqueles 7 a 1 não são nada frente ao que temos ainda a lucrar. O importante é que uns fiquem bem, sem que pareça que tudo vai mal. Contudo, uma coisa realmente, devemos admitir, tem de mudar.
O campeonato brasileiro atual não pode permitir que um clube dispare na frente. O campeonato não pode ficar sem graça, como a novela. Uma mão lava a outra. A forma como joga o Cruzeiro tem estragado a disputa. Esse é o problema dos pontos corridos. Alguém começa a jogar diferente e se sentir rei da cocada preta. Nosso futebol não pode mais tolerar isso. Se o Cruzeiro vai bem, tudo vai mal. A arbitragem já está fazendo a sua parte, mas o Cruzeiro deve se adaptar.
Alguns jornalistas também precisam entender que somos os novos bobos do futebol, mas não podemos demonstrar. Devemos trabalhar unidos para garantir o retorno financeiro. Isso é um empreendimento e deve ser gerido como tal. Vamos ajeitar tudo, porque o futebol moderno exige resultado. É balela dizer que nosso futebol é de resultados como se isso fosse negativo. O resultado é que pertence ao futebol.
É bom pra imprensa, pro Bom Senso, para CBF e pros clubes.
Somos penta. Ninguém é. A gente merece.
*Humberto Miranda é professor de Economia na UNICAMP.
Sobre o Autor
Colunas na Folha: https://www1.folha.uol.com.br/colunas/jucakfouri/