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Blog do Juca Kfouri

Três tricolores e um verde

Juca Kfouri

13/05/2013 14h00

POR LUIZ GUILHERME PIVA

Os hinos dos clubes de futebol em geral têm melodia e arranjo marcial, embora às vezes embalados como marchinhas, ranchos e dobrados. São muito parecidos, como se um continuasse o outro, na maioria das vezes.

E as letras? São também quase iguais entre si.

Com o mesmo altivo, altaneiro, orgulhoso e lutador espírito das melodias e arranjos, a tradição, o passado e a grandeza do time o põem como o melhor, o campeão entre todos e o que terá o mais alto pavilhão a tremular no futuro.

Tudo isso é dito em torno de três infalíveis palavras: história, vitória e – de longe, quase unanimemente, a mais usada – glória.

Há hinos que as repetem em várias estrofes. Glória, então, é como um farofa-fá de alguns deles.

Mas há uns poucos que, mesmo recorrendo a moldes melódicos parecidos e à história, às vitórias e à glória, trazem um talento específico, um encanto, um grão de sal.

Quatro em especial, para meu gosto.

Não sei se por acaso, mas são hinos em que letra e melodia se aproximam mais da canção popular brasileira. E cujos autores frequentam esse terreno.

O hino do Bahia, de Adroaldo Ribeiro Costa, arrebata e amolece com a brejeirice e a sensualidade do "mais um, mais um, Bahia".

Ali tem Gal, João, Bobô, Moraes e Galvão, Dorival – a Bahia ao inverso de Castro Alves, Rui Barbosa e Glauber Rocha, que são envoltos por  parampampans e fonronfonfons grandiloquentes.

O "mais um, mais um, Bahia" é o quê que o Baêa tem.

A primeira estrofe do hino do Fluminense (melodia de Lyrio Panicalli e letra de Lamartine Babo) é como a banda da canção do Chico subindo e descendo ladeiras, contornando praças e ruas, com o pessoal se juntando e cantando e chamando para que cantemos junto ondulando a voz e os braços em rimas internas e externas e tônicas e átonas nos picos e vales das ondas da evolução da banda – e eis o último verso emergindo como uma coda cantada em uníssono para renovar a estrofe. E mostrar que o que era doce não se acabou.

O hino do Grêmio, de Lupicínio Rodrigues, tem um entoo mais marcial, mas o refrão encanta. Aliterações, coloquialismo, subida de voz, palavras pouca usadas em hinos, um modo de dizer diferente.

A princípio, parece um bando de destemidos atravessando distâncias em luta.

Mas tem ali no fundo um samba-canção – de solitários atrás de seu amor – que conquista nosso apoio e nosso coro para cantarmos onde der e vier.

Por fim, o começo do hino do Goiás, de Tavito, Paulo Sérgio Valle e Regininha, é uma delícia contagiante. A melodia parece girar em volta do ouvinte, puxando-o para uma roda de dança, com uma viradinha (em "voz") de tirar o chapéu pras moças e começar a rodar pro outro lado. A letra com os "s" e "z" contornando as rimas internas desliza e sai como se respirássemos cantando.

E cantar até o "peito doer" e "perder a voz" são pepitas pra ecoar em todo o cerrado, levando o povo a dançar em roda numa enorme extensão do Brasil.

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Luiz Guilherme Piva canta histórias, vitórias e glórias alheias.

Ouça aqui os hinos do BAHIA, FLUMINENSE, GRÊMIO e GOIÁS</a>.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL

Sobre o Autor

Juca Kfouri é formado em Ciências Sociais pela USP. Diretor das revistas Placar (de 1979 a 1995) e da Playboy (1991 a 1994). Comentarista esportivo do SBT (de 1984 a 1987) e da Rede Globo (de 1988 a 1994). Participou do programa Cartão Verde, da Rede Cultura, entre 1995 e 2000 e apresentou o Bola na Rede, na RedeTV, entre 2000 e 2002. Voltou ao Cartão Verde em 2003, onde ficou até 2005. Apresentou o programa de entrevistas na rede CNT, Juca Kfouri ao vivo, entre 1996 e 1999 e foi colaborador da ESPN-Brasil entre 2005 e 2019. Colunista de futebol de “O Globo” entre 1989 e 1991 e apresentador, de 2000 até 2010, do programa CBN EC, na rede CBN de rádio. Foi colunista da Folha de S.Paulo entre 1995 e 1999, quando foi para o diário Lance!, onde ficou até voltar, em 2005, para a Folha, onde permanece com sua coluna três vezes por semana. Apresenta, também, o programa Entre Vistas, na TVT, desde janeiro de 2018.

Colunas na Folha: https://www1.folha.uol.com.br/colunas/jucakfouri/