A verdadeira história da "Lei Agnelo/Piva"
De como dois Pilatos entraram no Credo graças à mulher do cartola
Por GIL CASTELLO BRANCO*
Sempre fui apaixonado pelo esporte.
Nadei no Botafogo, remei no Vasco e no Flamengo, treinei vôlei no CIB e joguei basquete no Fluminense.
Fui, ainda, goleiro do "Maravilha" no futebol de praia e praticante de Karatê.
Como você pode observar um atleta polivalente (ou seria insistente?) à procura de sua vocação.
Para completar, casei-me com uma ex – campeã brasileira de hipismo e todos os filhos praticam ou praticaram esportes.
Assim sendo, após o fracasso do Brasil na Olimpíada de 2000, justificado pela falta de financiamento regular, imaginei a Lei das loterias.
A verba da jogatina já estava distribuída e aumentar a parcela do esporte significaria reduzir a de algum outro órgão, o que era inviável.
Desta forma tive a ideia de aplicar um percentual sobre o valor bruto das apostas deduzindo o valor obtido do montante destinado aos prêmios.
Neste caso, o único a poder reclamar seria o já feliz ganhador.
Negociei com a CEF este percentual (à época só admitiram 1,5%). Para evitar os contingenciamentos orçamentários, fiz o dinheiro ir diretamente da CEF para os Comitês, sem passar pelo Orçamento Geral da União.
Como então assessor do deputado Agnelo Queroz- até aquele momento um político bem conceituado – entreguei-lhe o projeto pronto.
Tendo em vista que os maiores beneficiários seriam o COB e o CPB, encaminhamos minutas aos Comitês para eventuais sugestões.
Como a resposta do COB não veio, o Agnelo apresentou o projeto, tal como o concebi, na Câmara.
Tempos depois, texto quase idêntico deu entrada no Senado, apresentado pelo senador Pedro Piva.
O André Richer, vice do COB, contou-me, posteriormente, como o projeto do Agnelo chegou ao Piva.
Ao receber a minuta enviada pelo Agnelo, o COB achou a ideia ótima, como seria óbvio.
No entanto, julgou que um deputado do PC do B, em pleno governo tucano, não conseguiria aprovar a proposta.
Assim, a Márcia Peltier (mulher do Nuzman), amiga da família Piva, encaminhou a minuta ao senador do PSDB, solicitando-lhe que apresentasse projeto nesse sentido no Senado.
Assim foi feito.
De fato, o projeto do Piva no Senado tramitou mais rapidamente e, após aprovado naquela Casa, foi para a Câmara.
Nesta ocasião, o projeto do Agnelo (com o mesmo teor) foi apensado ao do Piva.
Daí o nome da Lei Agnelo/Piva.
Em outras palavras, os ex parlamentares, Agnelo e Piva , entraram de gaiato neste navio.
Como curiosidade – é possível que você já tenha observado – nenhum dos dois consegue explicar a lei da qual foram os "autores".
Lembro-me de que o Agnelo, ensaiando o seu discurso de posse no Ministério, dizia : "Sou autor da Lei que destina 2% dos prêmios das loterias ao esporte…".
Fui obrigado a interrompê-lo para dizer: "Agnelo, não é 2% dos prêmios. É 2% do bruto, abatido do prêmio, o que é muito diferente".
O Piva, sem nenhuma afinidade com o esporte, nunca falou sobre este tema.
*Gil Castello Branco é economista e fundador e secretário-geral da Associação Contas Abertas, cujo sítio presta inestimável serviço à cidadania.
Sobre o Autor
Colunas na Folha: https://www1.folha.uol.com.br/colunas/jucakfouri/