Uns e outros
POR LUIZ GUILHERME PIVA
Dois argentinos conversam sobre fúbol.
Messi é Piazzolla. Maradona é Gardel.
Maradona é Cortázar. Messi é Borges.
Messi é Sarmiento. Maradona é Rosas.
Lionel é Nestor. Diego é Perón.
Maradona é Calamaro. Messi é Darín.
El Pibe es La Boca. La Pulga es Palermo.
Vinho branco. Vinho tinto.
Chorizo. Pescado.
Rubia. Mestiza
Bandoneón, milonga. Violino, baile.
Calam-se.
Questões de gostos, estilos, posições. Mas se equivalem.
Eis que um deles arremata:
Maradona é a cada dia mais passado. Messi é a cada dia mais presente.
O argumento é definitivo.
Concordam, enfim:
Maradona é cada vez melhor que Messi.
2.
Alto e esguio, mulato, jogou nuns times locais, na várzea, peladas, mas era vendedor, hoje é dono de boteco.
A bola vinha forte, alta, ao seu lado, ele esticava a perna como num arabesque do Nureyev, a bola adormecia no dorso do pé
e
descia
sedada
até
o
chão.
Tempero – apelido, claro. Mas era um grão de sal no meio dos insossos.
Aos quais – que por instinto corriam pedindo o lançamento – ensinava, depois de dominar a bola: "não se afastem – desloquem-se e aproximem-se, tabelem, mexam-se por perto."
Quase catalão.
Depois saía conduzindo-a em passos largos, como se usasse patins.
Mas gostava mesmo era do último passe, de pôr o colega na cara do gol. Uma obsessão.
Revejo-o no boteco simples, depois de trinta anos.
Ele me abraça como numa dança.
Desliza até o balcão – eu aprendi: fico perto.
Tira da gaveta jornais sépias, trincados, com fotos de times do interior.
E mostra a imagem de um amigo dele, desconhecido, que obscureceu numa agremiação qualquer – e se orgulha da suposta glória do outro.
A velha obsessão.
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*Luiz Guilherme Piva és més que un seguidor.
Sobre o Autor
Colunas na Folha: https://www1.folha.uol.com.br/colunas/jucakfouri/