O pênalti de Zico
Por ROBERTO VIEIRA
O pênalti foi criado no futebol no dia 3 de março de 1891.
Embora só fosse cobrado no ano seguinte.
Sessenta e dois anos depois, nascia um craque: Zico.
Zico que escreveria seu nome no futebol mundial pela arte, pelos gols.
Pelos pênaltis.
Pois os pênaltis não existiriam sem Zico.
Embora já desse seus primeiros chutes entre os profissionais da Gávea em 1970/ 71.
Foi apenas em 1974 que Zico deslumbrou o Rio de Janeiro.
Ganhando uma Taça de Prata.
Ganhando o título carioca.
Dois anos depois, duas cobranças de falta contra Uruguai e Argentina mexeram com a imaginação do povo.
Zico extrapolou as fronteiras da Baía de Guanabara.
Zico era o Pelé Branco.
Zico que entortava zagueiros, metia bolas na gaveta e tinha cara de menino.
Zico que batia pênaltis de forma magistral.
Invariavelmente, bola num canto e goleiro no outro.
Pênalti que foi reinventado por Zico.
Antes de Zico, apenas o Rei Pelé tinha enxergado beleza no tiro livre direto.
Copiando e consagrando a paradinha.
Deixando pra marcar de pênalti seu milésimo gol.
Caso contrário, pênalti era só penalidade, trocadilho.
Com Zico, virou pão e circo.
Mas havia sinais de fumaça.
Os goleiros ficaram espertos.
Quando a Revista Placar foi fotografar os segredos do fenômeno.
Pedrinho do Bonsucesso voou no canto direito e defendeu a pelota.
Acaso?
Coincidência?
Era o dia!
Vida que segue até a final da Taça Guanabara de 1976.
Bastava Zico cobrar e o Flamengo seria campeão.
Mazaroppi pula como um felino na direita e defende.
O Vasco confirma suas cobranças e sagra-se campeão.
Estupor.
A massa que ergue e destrói coisas belas, ruge indignada.
Pipoqueiro!
Perna-de-pau!
Só joga no Maracanã!
Zico deixou de ser unanimidade.
A seleção deixou de ser Zico mais 10.
Jorge Mendonça assumiu a ponta de lança de Cláudio Coutinho.
Por pouco tempo.
Quis o destino, ao redor de Zico brotasse uma geração de gênios do futebol.
No Flamengo: Júnior, Leandro, Andrade, Geraldo e Adílio.
Na seleção: Cerezzo, Falcão, Sócrates e Telê Santana.
Todos repudiando a democracia das massas.
Todos assinando embaixo da genialidade do Galinho.
Zico reergueu-se tricampeão brasileiro.
Campeão da Libertadores e Mundial Interclubes.
Até que o destino cruel assinou 'Sarriá!'
Destino que se revelaria mais cruel quatro anos depois.
Como? Em um pênalti!
Pênalti originado de um passe de Zico para o lateral Branco.
Zico que se recuperava de uma entrada assassina de um desses beques de usina.
Pênalti que surgia no inferno mexicano como um sinal do destino.
Um sinal de redenção.
O último pênalti para resgatar as lágrimas e as lesões.
Nada de canto direito!
Mas o pênalti foi defendido pelo goleiro Bats da França no canto esquerdo.
O menino Artur olhou para a marca penal.
Um círculo. Como a sua amada bola.
Careca chegou e lhe abraçou.
O mundo pareceu fugir sob suas chuteiras.
Pipoqueiro!
Perna-de-pau!
Só joga no Maracanã!
Depois, Zico marcou… de pênalti. Platini mandou nas nuvens.
Sócrates chutou nas mãos de Batts.
Bats papou um frango alemão.
E Maradona foi campeão.
A taça é o que permanece na história dos homens?
Talvez.
Porém, quem viu o Galinho jogar, sonhou nas asas da imaginação.
Imaginação que lembra as cobranças de Zico.
A gente pula num canto.
E a imaginação vai certeira… no outro!
Sobre o Autor
Colunas na Folha: https://www1.folha.uol.com.br/colunas/jucakfouri/