Topo

Blog do Juca Kfouri

Os negros na natação

Juca Kfouri

09/11/2008 10h14


Na quinta-feira passada publiquei, na "Folha", a questão abaixo.


Que rendeu algumas respostas interessantes, que também seguem mais abaixo.


É preto no branco


Começou com Lewis Hamilton no domingo em Interlagos e acabou com Barack Obama no meio da semana nos EUA.


Nem o mundo da F-1 nem o da política serão iguais daqui para diante e para sempre.


Parece que as últimas barreiras foram quebradas pelas urnas nos EUA e no volante de um McLaren.


Esportes muito mais esportivos têm como seus reis atletas negros não é de hoje, realidade que o automobilismo passa a conhecer e até mesmo o elitista golfe vive no papel do insuperável Tiger Woods.


Sim, porque no futebol temos Pelé, no basquete Michael Jordan, Arthur Ashe no tênis e no atletismo nem é bom falar.


E olha que estamos falando só de homens, porque entre as mulheres as coisas não são diferentes.


Nem por isso, no entanto, como se viu nas declarações do pai de Hamilton, a vida dos negros é um mar de rosas, vítimas constantes que são de manifestações racistas.


E é aí que a responsabilidade de todos nós aumenta na luta pela igualdade de tratamento, sem a bobagem do politicamente correto que quer impedir que se diga que a situação está preta, mas não liga quando alguém admite que teve um branco.


E um mistério ainda precisa de uma boa explicação: por que não temos grandes campeões negros na natação?


Meu pai dizia que, no Brasil ao menos, os negros eram barrados no exame médico mesmo nos clubes populares como o Corinthians e por isso não podiam freqüentar as piscinas.


Provavelmente uma realidade do tempo dele e que não imagino perdurar nem aqui nem muito menos em países majoritariamente negros, como os africanos.


Seja como for, fica a pergunta: por que não se vê uma Serena Williams nas piscinas?




Resposta dada por José Eduardo de Mello Amorozo:


Não sou entusiasta das seções "carta dos leitores" mas, com referência à sua coluna de hoje na Folha, não resisti a expor uma "teoria sem
nenhum respaldo científico" que formulei há um bom tempo.


Ela é baseada apenas em algumas observações e alguma tendência a pensar besteiras possivelmente aproveitáveis… quem sabe um dia.


Há 20 anos, passei uma longa temporada morando em Barra de Caravelas no sul da Bahia.


A população local composta em sua maioria por negros pescadores de camarão.


O lugar é (era) um paraiso da caça submarina.


Sua grande atração: o Parcel das Paredes, maior formação coralínea do Atlântico Sul a meio caminho do arqipélago dos Abrolhos.


Consequência da fartura de peixes que buscam abrigo e alimento nos corais, vários dos habitantes da vila, abandonaram o camarão e começaram a se aventurar sob as águas.



Com o passar do tempo acabei conquistando a amizade e o companheirismo de vários crioulos e passamos a sair juntos para mergulhar.


Resumindo minhas observações: eles têm enorme facilidade para afundar atrás dos peixes sem necessidade de cinto de lastro; quando na
superfície, tomando fôlego entre um mergulho e outro eles precisam se movimentar mais para se manter à tona (negros, em geral, não boiam).


Junte a esses fatos a supremacia nos esportes de força, resistência e explosão.


Conclusão: eles têm ossos, musculos e ligamentos mais densos além da propensão para acumular menos gordura que ajuda na flutuação(em geral
eles são mais enxutos que nós).


Eles são mais pesados, portanto, com alguma exceção que há de aparecer algum dia, eles nunca vão ser grandes campeões de esportes aquáticos.


Outro caro, e raro, leitor, cujo nome infelizmente perdi, respondeu o que segue:

Lendo a sua coluna de hoje, do qual sou fã, concordando com ela quase sempre, li a sua pergunta a respeito do porquê não se vê uma Serena Willians nas piscinas.


A resposta não é o preconceito, haja vista que a própria Serena é lider no tênis e o Tiger no golfe, dois esportes elitistas.


A questão é física.


Na piscina, entre outras coisas, quanto menos atrito houver do atleta com a água, ou seja quanto mais flutuabilidade houver, melhor será o seu rendimento.


O biotipo negro tem o quadril mais proeminente (força glútea) do que as outras raças (o que porém facilita em alguns esportes).


Essa carga maior, na região glútea, faz com que o peso seja grande nessa região, afundando mais o atleta dentro d'água.


Por isso, ele tem mais atrito com a água e menos flutuabilidade.


O jornalista Guilherme Freitas, diverge, de maneira convincente. 


Sou jornalista e há três anos cubro eventos esportivos ligados a natação.


Sou free-lancer no momento e faço coberturas para o site Best Swimming (www.bestswimming.com.br) e colaboro como correspondente de imprensa no Brasil para a FINA (Federação Internacional de Natação).


Com bastante bagagem e experiência no assunto posso afirmar que natação no Brasil é um esporte para poucos.


Para os que podem pagar.


O fato de haver poucos negros com destaque na natação não é pelas teorias genéticas de massa muscular (que rejeito totalmente e acho que isso é puro prencoceito e desculpa).


A dura verdade é a questão social.


Para ser um nadador competitivo, você tem que desenbolsar muito dinheiro.


Seja para comprar um traje (que pode custar até R$ 1.500,00), um acessório técnico ou até para pagar a escolinha.


A natação competitiva é um esporte de classe média alta para cima.


Mas quantos negros fazem parte da camada social mais rica do Brasil?


Poucos.


Portanto o número deles nas piscinas será menor.


Além disso, não existe uma divulgação na periferia ou um interesse dos clubes em olhar para os mais pobres.


Acho que nem a histórica medalha de Cielo vai fazer isso.


Popularizar o esporte como Guga e Daiane fizeram com o tênis e a ginastica.


Mesmo assim, tenho observado em muitos campeonatos que existem mais negros na categoria de base, alguns deles já tendo integrado as seleções brasileiras menores.


Um dos destaque é a Etiene Medeiras, pernambucana de 17 anos que esse ano foi vice-campeã mundial júnior.


A primeira e única mulher medalhista em um campeonato mundial de natação.


Este ano cobri dois mundiais de natação.


Um absoluto em Manchester (ING) e o Júnior em Monterrey (MEX) e gostaria de comentar sobre sua citação a respeito dos países africanos.


O grande destaque do mundial inglês foi uma africana, a nadadora do Zimbábue Kirsty Coventry.


Ela é branca, loira, treina e estuda nos EUA.


Em seu país existem poucas piscinas, a maioria fora das medidas oficiais.


Um dia fui jantar em um restaurante e encontrei a delegação da Namíbia.


Todos brancos, do técnico aos atletas.


Dos países africanos, a maior parte de seus nadadores são brancos.


No Mundial mexicano observei uma coisa interessante.


Sai do hotel e peguei o ônibus que leva os credenciados até a piscina.


A seleção sul-africana estava nele e vi apenas dois atletas negros, de uma equipe com mais de 10 nadadores.


Não havia mestiços. A


ssistindo a Copa do Mundo de Durban mês passado pela TV, os nadadores sul-africanos (maioria no evento) eram em sua maioria brancos.


Aos poucos os clubes vão recrutando novos atletas e as oportunidades vão aparecendo, mas ainda é muito pouco.


Para a natação se massificar deve haver piscinas públicas ou em comunidades carentes, fazendo com que os mais pobres (negros em sua maioria) se interessem em praticar a modalide, para quem sabe seguir uma carreira futura ou apenas pela segurança de aprender a nadar.


Mas para isso dependemos dos dirigentes e políticos que estão mais interessados em outras futilidades e a ilusão chamada Rio-2016.


Espero que um dia eles tomem vergonha na cara.


O leitor Carlos Toledo, no entanto, discorda, para concordar com os dois primeiros:


Pergunte as pessoas especializadas em resgate (bombeiros e afins) de afogados ou afogantes (sic) o que é mais difícil de sacar da água: um negro ou um branco.


Sim, pesquisas médicas fáceis de serem consultadas online mostram/provam que os negros possuem densidade ossea maior que brancos e orientais o que os deixa com menor poder de flutuabilidade.


É física e não preconceito.


E você, o que acha?, o blog pergunta. 


Em tempo: faltou mencionar a providencial lembrança do leitor Randall Neto, que recordou a medalha de ouro de Anthony Nesty, do Suriname, em SEUL-88, ao vencer o norte-americano Matt Biondi nos 100m borboleta, por um centésimo de segundo.


Nesty foi o primeiro negro medalhista de ouro da história das Olimpíadas que, em Pequim, teve , no revezamento 4×100 livre, o norte-americano CUllen Jones como o segundo negro a subir ao lugar mais alto do pódio.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL

Sobre o Autor

Juca Kfouri é formado em Ciências Sociais pela USP. Diretor das revistas Placar (de 1979 a 1995) e da Playboy (1991 a 1994). Comentarista esportivo do SBT (de 1984 a 1987) e da Rede Globo (de 1988 a 1994). Participou do programa Cartão Verde, da Rede Cultura, entre 1995 e 2000 e apresentou o Bola na Rede, na RedeTV, entre 2000 e 2002. Voltou ao Cartão Verde em 2003, onde ficou até 2005. Apresentou o programa de entrevistas na rede CNT, Juca Kfouri ao vivo, entre 1996 e 1999 e foi colaborador da ESPN-Brasil entre 2005 e 2019. Colunista de futebol de “O Globo” entre 1989 e 1991 e apresentador, de 2000 até 2010, do programa CBN EC, na rede CBN de rádio. Foi colunista da Folha de S.Paulo entre 1995 e 1999, quando foi para o diário Lance!, onde ficou até voltar, em 2005, para a Folha, onde permanece com sua coluna três vezes por semana. Apresenta, também, o programa Entre Vistas, na TVT, desde janeiro de 2018.

Colunas na Folha: https://www1.folha.uol.com.br/colunas/jucakfouri/