Jornalismo x Merchandising (Quando a Ética Não Basta)
Por NEY QUEIROZ de AZEVEDO*
A solidificação de uma sociedade democrática está intimamente ligada ao fortalecimento de uma imprensa livre e independente, assim como ao fortalecimento dos direitos fundamentais dos cidadãos.
Os veículos de comunicação desempenham tarefa de essencial importância na construção dessa sociedade: informando, denunciando, criticando, enfim, formando opinião.
Há que se manter clara, portanto, aos olhos do público consumidor de informação, a distinção entre o que é jornalismo e o que é publicidade.
É nesse ponto que surge o conflito entre o "merchandising", técnica comumente utilizada pelo mercado publicitário e o Código de Defesa do Consumidor, que impõe a identificação da propaganda como princípio básico da relação entre anunciante e consumidor.
Há que se entender aqui o "merchandising" como a forma de publicidade "disfarçada" de conteúdo, a exemplo do que ocorre nas telenovelas, onde os produtos são utilizados e apresentados dentro do contexto da história.
A questão se agrava quando essa chamada técnica publicitária deixa os programas de entretenimento e avança sobre os programas e textos jornalísticos.
Ultrapassando os limites da ética, tanto do jornalismo, como da publicidade, o problema torna-se jurídico, pois o artigo 36 do CDC veda a publicidade implícita.
Conforme aponta o jornalista Alberto Dines*, "os jornais sempre tiveram que lidar com questões que beiravam os limites éticos envolvendo o espaço publicitário, mas deixaram de lado a reflexão e atualmente aceitam propostas indecorosas, porque senão o concorrente as aceitará".
Surgem, então, as matérias pagas, os informes publicitários sem identificação, os "testemunhais" de jornalistas-apresentadores, usando e abusando da confiança do seu público.
Nota-se, portanto, que depender da ética e da moral dos veículos de comunicação pode ser arriscado para o consumidor, que não sabe mais se está lendo uma reportagem ou um "release" de determinado produto, produzido pela agência do anunciante e não por um jornalista imparcial.
Deve haver, portanto, especial atenção a estes atos e o início de um movimento que venha coibir tais práticas abusivas.
Movimento que vise a resgatar a ética e a importância da independência dos veículos de comunicvação.
E, mais do que isso, que venha coibir tais infrações —de forma firme e incisiva—, através das competentes medidas judiciais, sempre que forem lesados os direitos do consumidor.
*Advogado e jornalista pela PUC/PR e Mestrando em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná.
http://www.queirozazevedo.com.br
Sobre o Autor
Colunas na Folha: https://www1.folha.uol.com.br/colunas/jucakfouri/