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Blog do Juca Kfouri

Uma lei para resgatar o futebol brasileiro

Juca Kfouri

23/08/2014 08h34

Em "O Globo" de hoje:

POR PAULO ANDRÉ*

Os clubes precisam controlar seus déficits, limitar seus custos, pagar em dia seus contratos de trabalho, parar de antecipar receitas e padronizar seus balanços

'Os problemas costumam surgir depois, e não antes, da lei", foram as palavras usadas pela presidente Dilma Rousseff em reunião com o Bom Senso, quando ela se referia justamente à inexistência de amarras necessárias para que a Lei de Responsabilidade Fiscal do Esporte (LRFE) funcione devidamente. Pelo mesmo motivo, os atletas defendem mudanças na LRFE e têm se colocado veementemente contra sua aprovação "às pressas", como querem alguns dirigentes de clubes de futebol.

Aqueles que a defendem costumam dizer que a lei está redonda, que "tudo está lá", que muitas das sugestões propostas pelo Bom Senso já foram incorporadas à LRFE. Mas, no fundo, a proposta atual exige, em contrapartida ao parcelamento da dívida dos clubes, apenas a apresentação de Certidão Negativa de Débito (CND), uma vez por ano, como garantia "inquestionável" de uma gestão transparente no futebol. Ademais, cita o pagamento dos contratos, o equilíbrio econômico-financeiro e outros termos que costumam qualificar os mais "bem-intencionados" projetos de lei. Porém, o fato de inserir estes itens (não detectados pela CND) e não definir quem os fiscalizará e quais serão as punições em caso de infração é o que torna sua redação insuficiente.

Quantos são os clubes, por exemplo, que recebem patrocínio da Caixa — empresa pública que exige a CND — e nem por isso estão em dia com as suas dívidas fiscais e trabalhistas?

Não temos dúvida de que a lei, se aprovada, será mais uma incapaz de solucionar o problema para o qual ela foi criada, a não ser que a intenção seja apenas beneficiar os dirigentes, livrando-os de possíveis ações civis e criminais — apropriação indébita — e liberando verba (retida pela Receita) para que a gastança e a impunidade continuem sem controle.

Reitero, a proposta atual age sobre os sintomas (as dívidas fiscais) e se esquece da causa (a má gestão), ou seja, em breve a doença retornará, pois o que levou os clubes ao estado em que se encontram é a inexistência de critérios rigorosos de fiscalização e punição.

Diferentemente do que têm declarado na mídia alguns dirigentes, as mudanças que queremos na LRFE não tratam, sob hipótese alguma, de abrandar as punições aos clubes. O Bom Senso defende, sim, o rebaixamento em caso de não apresentação da CND. Porém, acreditamos e defendemos mais tipos (além da CND) e maior frequência de fiscalização e de punição (aviso, proibição do registro de jogadores, rebaixamento).

Para que esse controle seja eficiente, é necessária a criação de um órgão de fiscalização independente que faça um acompanhamento contínuo dessas gestões. Em outros termos, os clubes precisam controlar seus déficits, limitar seus custos, pagar em dia seus contratos de trabalho, parar de antecipar receitas e padronizar seus balanços, sob a supervisão atenta desse órgão que aplicará medidas disciplinares aos infratores.

A LRFE é a oportunidade que temos de exigir contrapartidas importantes e proporcionar aos clubes um padrão de gestão financeira capaz de resgatar o futebol brasileiro, não apenas sanar suas dívidas.

*Paulo André é jogador de futebol e integrante do Bom Senso F. C.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL

Sobre o Autor

Juca Kfouri é formado em Ciências Sociais pela USP. Diretor das revistas Placar (de 1979 a 1995) e da Playboy (1991 a 1994). Comentarista esportivo do SBT (de 1984 a 1987) e da Rede Globo (de 1988 a 1994). Participou do programa Cartão Verde, da Rede Cultura, entre 1995 e 2000 e apresentou o Bola na Rede, na RedeTV, entre 2000 e 2002. Voltou ao Cartão Verde em 2003, onde ficou até 2005. Apresentou o programa de entrevistas na rede CNT, Juca Kfouri ao vivo, entre 1996 e 1999 e foi colaborador da ESPN-Brasil entre 2005 e 2019. Colunista de futebol de “O Globo” entre 1989 e 1991 e apresentador, de 2000 até 2010, do programa CBN EC, na rede CBN de rádio. Foi colunista da Folha de S.Paulo entre 1995 e 1999, quando foi para o diário Lance!, onde ficou até voltar, em 2005, para a Folha, onde permanece com sua coluna três vezes por semana. Apresenta, também, o programa Entre Vistas, na TVT, desde janeiro de 2018.

Colunas na Folha: https://www1.folha.uol.com.br/colunas/jucakfouri/