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Blog do Juca Kfouri

Sérgio Martins, o repórter

Juca Kfouri

12/12/2013 02h36

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Morreu, aos 67 anos, de insuficiência renal, o autor da célebre reportagem da revista "Placar", Sérgio Martins.

Morreu como viveu, discretamente.

E provavelmente arrependido por ter apurado e escrito a matéria que, em 1982, abalou o futebol brasileiro e acabou com a credibilidade da Loteria Esportiva.

Sérgio Martins, avesso aos holofotes, amargurou-se com a impunidade dos mafiosos e com a pusilanimidade de tantos que procuraram desmentir o resultado de seu meticuloso trabalho para desvendar a face sórdida de nosso futebol.

Desde o silêncio cúmplice do comando da Caixa Econômica Federal à época, então ainda na ditadura, mas também depois, já no governo Sarney, sob o comando, na área de Jogos do banco, de Aécio Neves, até a recusa do Prêmio Esso de Jornalismo — com o fantasioso argumento de que a denúncia acontecera porque a revista iria fechar e queria desmoralizar o futebol nacional.

Ironicamente, depois que "Placar" viveu sua maior crise, em 1990, descontinuada como semanal, foi sob seu comando direto que sobreviveu como mensal, até 1995, quando, relançada, mudou de formato e política editorial.

Atormentado, Sérgio Martins atribuía ao seu extraordinário esforço durante um ano — desde o fio da meada que puxou na cidade de Santos, onde identificou a primeira das muitas quadrilhas espalhadas de norte a sul do país que manipulavam os jogos escolhidos para os testes da Loteria — o ostracismo a que foi relegado no mercado de trabalho nos últimos anos.

Verdade ou fantasia de uma personalidade introspectiva, fato é que Sérgio Martins, que tinha problemas de audição, recolheu-se o quanto pôde, apesar do respeito que despertou e manteve intacto em todos que privaram de seu convívio .

É lamentável que tenha sido assim, mas assim foi.

Tão lamentável como seu desaparecimento, embora seu exemplo vá permanecer para quem teve o privilégio de trabalhar ao seu lado.

Morre um grande, colossal jornalista, corpo e alma de repórter, dos maiores de todos os tempos.

Deixa três filhos e uma neta e era vascaíno de coração.

Ainda hoje será cremado na Vila Alpina, onde seu corpo será velado a partir das 14h30 em cerimônia curta para evitar sofrimentos, como queria e pediu à sua Sofia, ex-secretária de "Placar", agora, que pena, viúva.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL

Sobre o Autor

Juca Kfouri é formado em Ciências Sociais pela USP. Diretor das revistas Placar (de 1979 a 1995) e da Playboy (1991 a 1994). Comentarista esportivo do SBT (de 1984 a 1987) e da Rede Globo (de 1988 a 1994). Participou do programa Cartão Verde, da Rede Cultura, entre 1995 e 2000 e apresentou o Bola na Rede, na RedeTV, entre 2000 e 2002. Voltou ao Cartão Verde em 2003, onde ficou até 2005. Apresentou o programa de entrevistas na rede CNT, Juca Kfouri ao vivo, entre 1996 e 1999 e foi colaborador da ESPN-Brasil entre 2005 e 2019. Colunista de futebol de “O Globo” entre 1989 e 1991 e apresentador, de 2000 até 2010, do programa CBN EC, na rede CBN de rádio. Foi colunista da Folha de S.Paulo entre 1995 e 1999, quando foi para o diário Lance!, onde ficou até voltar, em 2005, para a Folha, onde permanece com sua coluna três vezes por semana. Apresenta, também, o programa Entre Vistas, na TVT, desde janeiro de 2018.

Colunas na Folha: https://www1.folha.uol.com.br/colunas/jucakfouri/