Mudei de opinião (ou um pedido de desculpas)
Por FELIPE DOS SANTOS SOUZA*
Não sei se há leitores de longa data deste blog.
Se há, talvez tenham se esquecido de um texto que saiu aqui.
Só que eu não me esqueci, porque era um texto meu – e, de todo modo, o dono do blog não me deixava esquecer da confusão que eu causei.
O tempo passou, e a celeuma daqueles dias adormeceu.
Foi em outubro de 2007. As palavras que eu escrevi diziam, em linhas gerais, que eu achava que Rogério Ceni não era diferenciado. Que, mesmo sendo um goleiro de categoria indubitável, cobrador de faltas como poucos, para mim, ele só seria diferenciado se fizesse um gol com bola rolando, driblando todo mundo e coisas assim. Claro, recebi críticas. E reagi de modo intempestivo, escrevendo um texto birrento, mal-educado mesmo. Até hoje me arrependo dele, do modo arrogante como tratei os leitores.
Felizmente, o tempo passa. Reavaliamos conceitos, mudamos de opinião. E, hoje, nesta quarta-feira de tão especiais sentimentos aos são-paulinos, eu decidi que tinha um dever. Escrever dizendo do profundo respeito por Rogério Ceni, que se solidifica hoje, com seu milésimo jogo pelo São Paulo. Pensei até em escrever uma carta e enviar ao clube, aos cuidados dele, só para pedir desculpas por eventuais descortesias cometidas daquela vez. Só que, agora, eu vi que não era necessário somente me desculpar com ele. Era necessário ser mais cortês com os leitores.
Já o achava um grande goleiro, muito bom. Além de ter sido uma amostra da evolução por que a posição passou na última década (já não basta saber apenas jogar embaixo das traves, mas também saber iniciar jogadas com os pés), Rogério exibiu a capacidade de ter ótimas atuações quando elas são necessárias. Lembre-se, aqui, de dois jogos.
O primeiro: São Paulo 1×0 Ponte Preta, pelo Campeonato Brasileiro de 1999. Após ver o Botafogo ganhar os pontos da partida em que ambos haviam se enfrentado, pela escalação irregular de Sandro Hiroshi, o São Paulo entrou no gramado do Morumbi cuspindo fogo. Estava bem na disputa de vaga nas quartas de final, mas queria demais a vitória. E, num Morumbi lotado, Rogério foi o dínamo do time. Defendeu tudo, fez o gol da vitória por 1 a 0 (de falta, como sói acontecer), animou o time, foi quase um torcedor em campo.
O segundo merece palavras mais sintéticas: São Paulo x Liverpool, a final do Mundial de Clubes de 2005. Basta lembrar da falta cobrada por Gerrard. E de Rogério, com os meniscos pedindo a cirurgia que seria feita dias depois, voando para fazer uma das defesas mais importantes de sua carreira. Um lance fundamental no esforço são-paulino para conquistar o torneio.
Até que chega este 7 de setembro que me faz ver o quanto Ceni é, sim, diferenciado. Um dia que merece um pensamento. Não é que fazer 1000 jogos por um clube seja raro no Brasil. É raro no mundo. Pegue-se como exemplo os rivais são-paulinos nos títulos mundiais. No Liverpool, o meia Ian Callaghan fez 857 jogos com a camisa dos Reds, entre 1960 e 1978. No Milan, sabe-se, houve Paolo Maldini, com 902 jogos, entre 1984 e 2009. No Barcelona, Xavi: 723 partidas, desde 1998.
E o feito fica maior ainda quando se sabe que Rogério só tornou-se titular absoluto em 1997, quando tinha 24 anos – idade ainda baixa, mas nada que possibilitasse chamá-lo de "promessa". O que havia era um carinho da torcida são-paulina, como que pensando "é o substituto do Zetti, joga bem, esse garoto, foi bem na Copa Conmebol de 1994".
Pois bem, chegou a hora da torcida são-paulina celebrar aquele que é o seu maior ídolo sempre. E chegou a minha hora de pedir desculpas. Porque, se pensar isso ou aquilo do estilo de jogo de Rogério vai de cada um, feitos como o de hoje exigem que se trate o dono deles com o maior respeito possível.
Enfim, mudei de opinião. Não é crime, né?
*Felipe dos Santos Souza já enveredou, e bem, pelo jornalismo e é estudante de História na PUC.
Sobre o Autor
Colunas na Folha: https://www1.folha.uol.com.br/colunas/jucakfouri/