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Blog do Juca Kfouri

O apito do juiz

Juca Kfouri

17/03/2011 18h15

A LINGUAGEM DO FUTEBOL – O JUIZ E O SEU APITO

Por DAVID AZOUBEL NETO*

O apito é um instrumento que serve para assinalar um significado específico numa partida de futebol.

O juiz determina, com um pequeno sopro, o início e o fim do jogo.

Ele comunica, à distância mais ou menos próxima, se a bola saiu, dá o assobio que serve de voz de comando para a parada ou a continuidade do jogo.

Escanteios, faltas, jogadas em impedimento, cobrança de uma penalidade máxima ou média, são assinaladas pelo sopro que provoca um ruído estridente, um silvo cortando o ar, uma ordem de comando que pode interromper o curso normal da partida.

O apito do juiz serve para por ordem no jogo. É verdade que ao ato de soprar o apito seguem-se, costumeiramente, os gestos e indicações.

O apito, com o seu código de linguagem, implica na redução das comunicações verbais entre o juiz e os jogadores.

Não que ele exclua definitivamente o uso da palavra.

O juiz, num primeiro momento, pode preferir chamar a atenção de um jogador, advertindo-o contra suas jogadas perigosas, tentativas de machucar um adversário.

A invenção dos cartões veio ajudar a comunicação através de uma linguagem não verbal. Isso é importante, sobretudo em se tratando de jogadores que falam uma língua que o juiz desconhece.

O uso da obediência às regras do futebol através desses meios de comunicação – o apito, os cartões e os gestos, completam o sistema de sinalização que permite a administração do jogo.

Fica, desse modo, superada a barreira do desconhecimento da língua quando paises de idiomas diferentes se defrontam numa partida de futebol.

É interessante esse aspecto do futebol permitindo a confluência para uma linguagem universal.

O jogo é iniciado, terminado e administrado por um sopro.

Lembra, à distância, a imagem bíblica de Deus fazendo a alma do homem através de um sopro, um gesto simples e condensado que é, ao mesmo tempo, uma representação da vida, tanto no sentido de sua concretude semiológica como no sentido das abstrações que podem se estender a outras metáforas.

Contudo, essa comparação não é apenas uma metáfora.

O juiz, num jogo, é a autoridade máxima. Mais do que isso, ele é o dono da verdade. Se ele apita para marcar um pênalti, um gol, não importa se foi ou não foi. No que pesem todos os seus esforços para ser justo e verdadeiro, ele é, nesse momento, alguém que cria uma verdade. É a sua ordem, a sua palavra (sopro) que cria essa verdade, um estado de ser. Ora, isso o aproxima bastante de uma divindade.

A vida de todos nós depende, o tempo todo, de um sopro. Esse sopro poderá ser transformado em palavras, porém vai além e aquém das palavras.

David Azoubel Neto é psicanaliste e autor de "O futebol como linguagem".

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL

Sobre o Autor

Juca Kfouri é formado em Ciências Sociais pela USP. Diretor das revistas Placar (de 1979 a 1995) e da Playboy (1991 a 1994). Comentarista esportivo do SBT (de 1984 a 1987) e da Rede Globo (de 1988 a 1994). Participou do programa Cartão Verde, da Rede Cultura, entre 1995 e 2000 e apresentou o Bola na Rede, na RedeTV, entre 2000 e 2002. Voltou ao Cartão Verde em 2003, onde ficou até 2005. Apresentou o programa de entrevistas na rede CNT, Juca Kfouri ao vivo, entre 1996 e 1999 e foi colaborador da ESPN-Brasil entre 2005 e 2019. Colunista de futebol de “O Globo” entre 1989 e 1991 e apresentador, de 2000 até 2010, do programa CBN EC, na rede CBN de rádio. Foi colunista da Folha de S.Paulo entre 1995 e 1999, quando foi para o diário Lance!, onde ficou até voltar, em 2005, para a Folha, onde permanece com sua coluna três vezes por semana. Apresenta, também, o programa Entre Vistas, na TVT, desde janeiro de 2018.

Colunas na Folha: https://www1.folha.uol.com.br/colunas/jucakfouri/