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Blog do Juca Kfouri

Edson e Manuel

Juca Kfouri

28/10/2010 14h13

Por ROBERTO VIEIRA

Hoje, Garrincha completaria 77 anos.

Garrincha que faz anos cinco dias depois do Pelé.

A coincidência das datas induz uma reflexão.

Porque Garrincha é visto como inocente e bonachão fora dos campos?

Enquanto Pelé é cobrado em cada esquina a cada escorregão?

Qual a diferença entre o Edson e o Manuel?

Edson se recusou a reconhecer uma filha.

Parte da torcida o vaia até hoje.

Longe do texto elogiar a conduta.

Mas Garrincha abandonou uma penca de filhos.

No Brasil, na Suécia, sabe-se lá onde mais.

Mesmo assim, o ato de Edson é sempre lembrado.

E o de Garrincha é folclorizado.

Como o de um bom selvagem.

Em outros campos, Edson foi exemplo de atleta.

Não bebia, não fumava, treinava mais que todo mundo.

Enquanto Manuel era o avesso do avesso do avesso.

Edson que jogou tão machucado quanto Manuel.

Ambos esquartejados.

Porém, a imagem do Rei saindo em frangalhos na Copa da Inglaterra.

Depois de lutar com uma perna só diante dos portugueses.

É menos lembrada que a clavícula do Kaiser.

Menos glamourizada que os joelhos do Manuel.

Não se trata aqui de juízo de valores.

Pelé e Garrincha são fenomenais, craques, gênios.

Edson e Manuel são humanos, falíveis, marias-madalenas.

Entretanto.

Talvez o motivo da percepção distinta entre Edson e Manuel.

Seja outro.

Menos inocente – e mais ligado ao preconceito de classes e de cor.

Edson, menino pobre e faminto, negro e inculto.

Seria idolatrado se morresse pobre e entorpecido.

Como devem morrer os negros neste país.

Como morreu Garrincha.

Mulato inzoneiro alcoolizado e falido.

Semideus de um país que aplaude os seus ídolos do povo.

Principalmente quando morrem miseráveis e esquecidos…

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL

Sobre o Autor

Juca Kfouri é formado em Ciências Sociais pela USP. Diretor das revistas Placar (de 1979 a 1995) e da Playboy (1991 a 1994). Comentarista esportivo do SBT (de 1984 a 1987) e da Rede Globo (de 1988 a 1994). Participou do programa Cartão Verde, da Rede Cultura, entre 1995 e 2000 e apresentou o Bola na Rede, na RedeTV, entre 2000 e 2002. Voltou ao Cartão Verde em 2003, onde ficou até 2005. Apresentou o programa de entrevistas na rede CNT, Juca Kfouri ao vivo, entre 1996 e 1999 e foi colaborador da ESPN-Brasil entre 2005 e 2019. Colunista de futebol de “O Globo” entre 1989 e 1991 e apresentador, de 2000 até 2010, do programa CBN EC, na rede CBN de rádio. Foi colunista da Folha de S.Paulo entre 1995 e 1999, quando foi para o diário Lance!, onde ficou até voltar, em 2005, para a Folha, onde permanece com sua coluna três vezes por semana. Apresenta, também, o programa Entre Vistas, na TVT, desde janeiro de 2018.

Colunas na Folha: https://www1.folha.uol.com.br/colunas/jucakfouri/