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Blog do Juca Kfouri

Discordando do Tostão e do PVC

juca kfouri

23/05/2010 14h12

*Por HUMBERTO MIRANDA DO NASCIMENTO

Ontem que levou uma taçada na cabeça fui eu ao apostar na derrota da Inter (contra Dunga), afinal sou antidunga.

Entendo, mas discordo do Tostão quando diz na sua coluna de hoje (domingo) na "Folha" que a responsabilidade da perda ou da vitória da Seleção na Copa não será de Dunga.

Ora, é praticamente impossível separar uma coisa da outra.

Quem convoca tem grande responsabilidade e o resultado final pode ser a coroação do sucesso ou do fracasso de uma opção por determinadas características dos jogadores mais úteis a seu sistema de jogo.

Dunga está defendendo uma fórmula vencedora.

Será que é tão difícil as pessoas entenderem isso?

Dunga não gosta de futebol-arte!

Não gosta porque não o entende, não é só por birra.

Ele ignora a essência do jogo comandado pela habilidade no meio de campo.

Ele acredita piamente que poder de marcação e contra-ataque é o mais eficiente modo para vencer, ao contrário do que acha PVC, também em artigo na mesma "Folha", que tenta explicar isso citando a Inter como exemplo.

O PVC quer convencer que a Inter não foi vitoriosa jogando como Dunga acredita ser a melhor maneira?

Tá, então explica a tríplice coroa?

Provou-se que é eficiente sim.

Nunca neguei que este é uma forma de jogar que dá resultado, especialmente quando, por inércia, acaba vencendo.

Se ano que vem se mantiverem os mesmos times, os mesmos técnicos e os mesmos jogos, em condições normais de temperatura e pressão, duvido que a Inter se consagre novamente vencedora.

Times assim contam com a inércia para vencer, isto é, amarram tanto a partida pelo poder de marcação que o resultado acaba acontecendo a seu favor numa lance de precipitação do adversário, que se torna mais vulnerável na defesa ao tentar impor sua ofensividade.

O contra-ataque é a arma do momento certo na hora do vacilo defensivo.

Hoje os times, vide Inter e Brasil, aperfeiçoaram o poder de marcação (a idéia de que o jogo começa a ser ganho pela montagem do sistema defensivo) e usam o contra-ataque para matar o jogo.

Não importa se o resultado será de 1, 2, 3 ou 4 a 0, mas que eles tenham se originado desse sistema de jogo.

O que nós reclamamos na Seleção é, primeiro, que isso não é futebol; segundo, que não é futebol brasileiro; terceiro, que o meio de campo é a alma do time (de preferência, habilidoso) e, quarto, que devemos buscar sempre o futebol-arte como fim, o sentido da vida.
O time de Dunga tem um monte de volantes, mas poucos "motoristas" com habilidade para criar ou fazer o jogo mudar.

Kaká é utilizado mais como um elo do contra-ataque do que por sua habilidade natural; Robinho, para abrir a defesa; e Luis Fabiano para encaçapar, se possível, todas.

O problema é  saber se Kaká conseguirá exercer tão bem esse papel como se espera dele.

Essa é a maior dúvida.

Se Robinho vai subir de produção nos lances que exigem mais velocidade e objetividade e se Luis Fabiano vai continuar sendo artilheiro.

Ninguém quer mudar a cabeça de Dunga, mas que ele demonstrasse mais transparência nas opções que tem para determinadas posições.

Um técnico que se sente ofendido toda vez que se pergunta sobre isso não é, a meu ver, um técnico para a Seleção Brasileira.

O fato de vc acreditar piamente numa fórmula vencedora não quer dizer que ela não contenha falhas ou limitações.

É preciso reconhecê-las e Dunga não demonstrou em nenhum momento essa consciência, porque acredita que o ingrediente principal da vitória nesse sistema é a fidelidade do grupo, não a qualidade dos jogadores.

Não que os atuais convocadas não tenham qualidades, apenas não são estas que dão coerência ao discurso de Dunga.

A coerência que Dunga alega não se baseia apenas nos resultados, mas na fé do grupo.

Há uma irracionalidade no treinador que marca sua frequente retórica contra os jornalistas.

Ele substituirá Kaká por Julio Batista por razões técnicas ou por fé?

O fato de Júlio ser muito forte é o que o transforma em opção e não a semelhança de estilo.

No final das contas, a força resolve.

Acredito que Tostão e PVC sabem disso, mas às vezes aparecem com explicações que acabam indo de encontro àquilo que querem dizer.

É minha opinião.

*Humberto Miranda do Nascimento é professor da Universidade de Campinas.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL

Sobre o Autor

Juca Kfouri é formado em Ciências Sociais pela USP. Diretor das revistas Placar (de 1979 a 1995) e da Playboy (1991 a 1994). Comentarista esportivo do SBT (de 1984 a 1987) e da Rede Globo (de 1988 a 1994). Participou do programa Cartão Verde, da Rede Cultura, entre 1995 e 2000 e apresentou o Bola na Rede, na RedeTV, entre 2000 e 2002. Voltou ao Cartão Verde em 2003, onde ficou até 2005. Apresentou o programa de entrevistas na rede CNT, Juca Kfouri ao vivo, entre 1996 e 1999 e foi colaborador da ESPN-Brasil entre 2005 e 2019. Colunista de futebol de “O Globo” entre 1989 e 1991 e apresentador, de 2000 até 2010, do programa CBN EC, na rede CBN de rádio. Foi colunista da Folha de S.Paulo entre 1995 e 1999, quando foi para o diário Lance!, onde ficou até voltar, em 2005, para a Folha, onde permanece com sua coluna três vezes por semana. Apresenta, também, o programa Entre Vistas, na TVT, desde janeiro de 2018.

Colunas na Folha: https://www1.folha.uol.com.br/colunas/jucakfouri/